sábado, 28 de outubro de 2017

O estrangulador, de Sidney Sheldon



Capa do livro O estrangulador de Sidney Sheldon






A novela "O Estrangulador", ambientada em Londres, gira em torno de um assassino em série que tem por fito estrangular mulheres em noites chuvosas. A polícia inglesa tem por únicas informações, acerca do assassino em série, o fato de ele sempre atacar as suas vítimas em noites chuvosas, estrangulando-as com uma corda.

O sargento Sekio assume o caso, tendo a missão de rastrear o assassino em série, que até aquele momento não havia deixado nenhuma pista referente à sua identidade.

Fotografia de uma cidade em dia chuvoso


O contato do sargento Sekio com Akiko, uma moça que sobreviveu ao ataque, faz com que os dois se apaixonem. Paralelamente, o assassino decide procurá-la, pois ela viu o seu rosto. Com isso, temos o coração da trama policial de Sheldon.

Análise de O estrangulador


Diferente de muitos romances de mistério policial, nos quais não sabemos quem é o assassino, neste logo nas primeiras páginas o conhecemos e ainda descobrimos o porquê de ele matar as suas vítimas em noites chuvosas. Com isso, a emoção da novela fica pelo embate entre ele e o sargento Sekio, que vai aos poucos montando as peças do quebra-cabeça das motivações do assassino.

No geral, a novela é uma boa história policial, sendo uma leitura leve e descompromissada, podendo ser realizada em um único dia. O fato de não ter lapidado os personagens, bem como as suas motivações, faz com que a novela seja apenas regular, porém um bom passatempo.



quinta-feira, 26 de outubro de 2017

A hora da estrela, de Clarice Lispector


Capa do livro A hora da estrela de Clarice Lispector




Publicado em 1977, A Hora da Estrela é considerado um dos grandes clássicos da literatura brasileira. A história tem duas camadas; na primeira ocorre uma participação ativa do escritor. Ele a todo o momento interrompe a narrativa para conversar com o leitor.

O autor busca justificar o fato de estar contando essa história. Ele afirma, em determinado trecho, que o livro não será lido pelos pobres, pois eles têm fome e quem tem fome não tem tempo para a literatura. A classe média é o leitor potencial e esperado do romance; com isso, o autor busca justificar o motivo de ter a necessidade quase que física de contar esses acontecimentos que fogem do seu cotidiano e do cotidiano daqueles que irão ler.

Enredo de A hora da estrela 

O livro narra a vida de Macabéa, uma imigrante nordestina que deixa o interior de Alagoas e se muda para o Rio de Janeiro.
Fotografia de Clarisse Lispector


Temos contato com a situação de exclusão vivenciada por Macabéa, pois ela faz parte de uma massa de excluídos devido a sua raça/etnia ou devido ao seu baixo capital cultural. Com isso, ela vive uma vida à margem da sociedade em uma das maiores metrópoles brasileiras.

Ela possui uma instrução precária. A sua principal fonte de cultura é um programa de rádio que ela ocasionalmente escuta. Macabéa trabalha em um escritório como datilógrafa, apesar de ter tido uma alfabetização precarizada. O salário dela, que mal dá para sobreviver, faz com que ela viva uma vida de privações, tanto alimentares quanto de lazer.

O fato de ter sido criada pela sua tia — criação fria e destituída de carinho — faz com que ela tenha uma autoestima baixa e dificuldade para sonhar ou ter esperança no futuro. O relacionamento com Olímpico, um metalúrgico paraibano, surge como possibilidade de a protagonista romper o domo que a cerca e se tornar capaz de se relacionar socialmente, mas ela não consegue ultrapassar essa barreira imposta por uma vida de privações.

A ideia de contar essa história parte de um encontro, em uma das ruas do Rio de Janeiro, entre o escritor e uma imigrante nordestina. No breve momento em que ele a vislumbrou, o escritor se sentiu capaz de captar a essência dela e, após esse contato, passou a desenvolver uma necessidade quase física de transportar esse encontro para as páginas de um livro, contando uma história sem nenhum tipo de preparo ou esquematização; simplesmente a história surgia na sua mente, sem ele ter o poder de mudar o destino da personagem.

Fica o questionamento do porquê de ele sentir a necessidade de contar esse relato. Talvez Macabéa seja a materialização de um urbano que foge do controle e extrapola as relações humanas. Em determinado trecho, ele afirma que a cidade é uma máquina e seus habitantes são apenas parafusos.

Imagem do filme A hora da estrela


O consumo em massa, a divisão do trabalho no modo de produção capitalista e o enfraquecimento dos laços afetivos dão pistas da alienação das pessoas que habitam em um grande centro urbano como o Rio de Janeiro.

Ele, enquanto artista, possui sensibilidade e uma aguçada apreensão da realidade, e sente a necessidade de externalizar seus sentimentos referentes à vida na modernidade. Macabéa surge como objeto de construção de sua obra, pois ela é a materialização de um urbano repleto de contradições. Esse urbano é fruto da proximidade espacial das pessoas em determinado território; contudo, apesar de atrair cada vez mais as pessoas, é excludente e impessoal, permanecendo muitos habitantes à margem do social, tal como Macabéa, uma protagonista improvável para um romance escrito para a classe média.


segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Sonhos de Bunker Hill, de John Fante


Capa do livro Sonhos de Bunker Hill de John Fante


O romance tem por protagonista Arturo Bandini, um jovem escritor que deixa o Colorado para ir morar em Los Angeles. Apesar de o livro ter sido escrito nos anos oitenta, é ambientado nos anos trinta, época de ouro do cinema americano.

Ao chegar em Los Angeles, Bandini, alter ego de Fante, vai morar no subúrbio, no bairro Bunker Hill. Após ficar um tempo trabalhando como garçom, tem um dos seus contos publicado em uma revista.

Fotografia de John Fante

Hollywood engole Bandini


A boa aceitação de seu conto fez com que algumas portas se abrissem para Bandini, que deixa o emprego de garçom para trabalhar em Hollywood como roteirista. Com isso, Bandini rapidamente ascende na pirâmide social, deixando para trás o subúrbio e as dificuldades financeiras. Contudo, a trajetória de Bandini em Hollywood se mostra tortuosa, envolvendo-se tanto com bebidas quanto com mulheres.

Em determinado trecho, Bandini afirma ter a impressão de que as pessoas em Hollywood aparentam ser apenas nomes, ou seja, como se não fossem reais. Aliás, tudo ali parece ser irreal e superficial, fato que fez com que Bandini se sentisse deslocado nesse ambiente — ao contrário de Bunker Hill, onde ele era capaz de ordenar seus pensamentos e se sentir seguro e vivo.

Com isso, vemos que a periferia da cidade, sendo o lugar onde o cotidiano de boa parte da população se dá, tem uma materialidade maior do que Hollywood, lugar de entretenimento e espetáculo, que se mostra frio e impessoal. Conforme a história vai se desenrolando, cada vez mais Bandini vai se perdendo. Quando deixou o Colorado, ele buscava em Los Angeles e na literatura uma forma de sentido para a sua vida; contudo, ele não foi capaz de encontrar esse sentido ali.

Sua formação católica e, consequentemente, dogmática permanece em constante embate com a sua formação artística, de caráter mais liberal. A sua aparente necessidade de sexualizar todas as mulheres, sua constante dificuldade de consumar as relações sexuais e o posterior arrependimento de "estar em pecado" mostram esse embate que ocorre na consciência do personagem, que vive transitando entre o divino e o profano.

A rápida ascensão de Bandini, sem ter uma produção literária consolidada, fez com que ele não se sentisse seguro para escrever, pois ficava com a sensação de que, tão rápida e fácil quanto foi a sua ascensão, a queda seria na mesma medida.
Fotografia do suburbio de Los Angeles

Somou-se a isso a desilusão do personagem com Hollywood e a não valorização ou busca pelo talento verdadeiro. O estúdio que o contrata não lhe dá projetos para trabalhar e, quando lhe dá, o resultado final é completamente diferente daquilo que ele escrevera.

Em uma época em que a indústria do entretenimento alcançava um patamar nunca antes visto, diversos jovens escritores talentosos se dirigiram até Hollywood em busca de fama e reconhecimento; contudo, esse mundo de nomes e não de seres humanos os sugou para dentro de si. Perderam-se muitos talentos em meio a esse turbilhão, restando ao leitor a expectativa referente ao futuro de Bandini.

Nota: 10.




quinta-feira, 19 de outubro de 2017

O caçador de Androides, de Philip Dick


Capa do livro O caçador de Androides de Philip Dick


O Caçador de Androides é considerado um dos melhores romances de ficção científica já escritos. Seu sucesso colocou em evidência o escritor Philip K. Dick, conhecido pela disseminação de teorias ligadas à artificialidade da nossa existência, tais como as teorias popularizadas pelo filme Matrix, nas quais inteligências superiores, artificiais ou não, são responsáveis pela produção da nossa realidade.
Fotografia de Philip Dick

Dick conseguiu com maestria, no transcorrer do livro, fazer com que o leitor sinta a atmosfera claustrofóbica de um planeta Terra destruído pela raça humana.

O filme estrelado por Harrison Ford, intitulado Blade Runner, contribuiu para a fama da história de Dick; contudo, o livro tem algumas diferenças em relação ao filme, diferenças que contribuem para dar uma voz própria ao romance.

Enredo de O caçador de Androides


Em um mundo futurista destruído após uma grande guerra chamada Terminus, o planeta Terra ficou quase inabitável devido a uma camada de poeira que tomou conta da atmosfera, provocando o fim de muitos ecossistemas.

Os seres humanos que possuíam uma posição social mais elevada migraram para outros planetas, reconstruindo suas vidas em colônias como Marte. Os que não possuíam condições financeiras para tanto foram obrigados a permanecer no que restou do planeta Terra. Com isso, a Terra foi literalmente deixada para aqueles pertencentes a uma classe social mais baixa ou aqueles com algum tipo de deficiência, seja física, provocada pela guerra, seja mental.

Os poucos animais que foram capazes de sobreviver a esse ambiente cada vez mais hostil se transformaram em artigos de luxo, sendo negociados por grandes somas. Nesse mundo, ter um animal de estimação — seja um cachorro, ovelha ou bode — significa um sinal de status, pois, no que restou da vida social, poder ter um animal de estimação é um privilégio para poucos.

Poster do filme Blade Runner


Rick Deckard

O personagem principal, Rick Deckard, é um caçador de androides a serviço da polícia de São Francisco. Os androides foram desenvolvidos para servirem aos humanos nas colônias estabelecidas em outros planetas. Conforme foram criados androides cada vez mais inteligentes, fortes e parecidos com os seres humanos, foi desenvolvido um dispositivo que limitava a vida útil de um androide para, no máximo, quatro anos; ou seja, após quatro anos, eles deixam de funcionar.

Um grupo de androides da última geração foge da colônia e vai para o planeta Terra para viver sem ser escravizado pelos humanos. Deckard é designado para caçá-los e "aposentá-los", expressão sinônimo de extermínio de androides.

Deckard não gosta de sua profissão e não se sente estimulado a praticá-la; contudo, a morte de sua ovelha e a consequente substituição por uma ovelha sintética fazem com que ele busque dinheiro para comprar um animal de verdade. Como já foi dito, ter um animal de verdade é um sinal de status, e Deckard se preocupa com o que seus vizinhos pensam dele.

Com isso, acompanhamos Deckard na caçada aos androides; contudo, conforme ele vai matando-os, questões existencialistas vão aos poucos tomando conta dele.

Os novos androides são muito parecidos com seres humanos; o principal diferenciador é a empatia. Os androides, em tese, são incapazes de sentir empatia, seja por um animal, seja por um humano, seja por outro androide. Contudo, ao realizar os testes nos androides, Deckard percebe que a nova geração consegue ser capaz, em alguns momentos, de ter sentimentos que se aproximam da empatia, podendo ser citado o fato de os androides se auxiliarem durante a fuga, trabalhando em equipe para garantir a sobrevivência de todos.

Arte do filme Blade Runner



No transcorrer do romance, conforme temos contato com os androides — inclusive com os androides que não sabem que são androides — vamos notando o quão parecidos com os humanos eles são; enquanto que, ao termos contato com o modo de vida dos humanos nessa Terra em degradação, vamos percebendo o quão artificiais eles se tornaram. Pode-se citar o aparelho, que quase todos os habitantes possuem em suas casas, responsável por criar artificialmente as mais variadas emoções, indo desde a alegria até a tristeza. Nesse mundo, os seres humanos passam cada vez mais imersos em si mesmos, tendo pouco contato interpessoal, fato que gera uma sociedade cada vez mais desumanizada, seja pelo planeta em degradação, seja pela artificialidade cada vez mais necessária para que os mesmos fujam da realidade.

Com isso, a todo o momento, diante da humanização dos androides e da desumanização dos humanos, nos perguntamos quem são os verdadeiros humanos, ou até que ponto a ciência pode ser capaz de tanto criar novas formas de vida quanto tornar a vida humana o mais artificial possível.

O Caçador de Androides é um livro fantástico, no qual , ao nos debruçarmos sobre o mesmo, diversas questões existencialistas nos acometem, gerando uma reflexão sobre o que é ser humano.

Nota: 10.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

A Humilhação, de Philip Roth



CAapa do livro A Humilhação, de Philip Roth


Philip Roth foi um dos mais prestigiados escritores americanos da segunda metade do século vinte e início do século vinte e um. Falecido recentemente, deixou de publicar livros alguns anos antes de morrer.

Diversas de suas obras foram transpostas para o cinema; seus personagens foram interpretados por grandes atores, tais como Al Pacino e Anthony Hopkins.

A sociedade americana é o grande tema dos livros de Roth. Ele é um grande intérprete da cultura americana, sempre focando suas obras em temas controversos e em personagens problemáticos e profundos.

Fotografia de Philip Roth


Resenha de A Humilhação, de Philip Roth


O romance "A Humilhação", publicado em 2009, foi um dos últimos livros publicados por Roth. A história gira em torno de um grande astro do teatro americano que, de uma hora para a outra, torna-se incapaz de interpretar.

Após seu último trabalho no teatro ser um fracasso total de público e crítica, Axler se refugiou na sua mansão e começou a ter pensamentos suicidas diante do fracasso naquilo que fazia dele uma pessoa especial.

Após Axler se tornar incapaz de atuar, ele perdeu o seu chão, pois perdeu aquilo que o tornava vivo; ou seja, tudo deixou de fazer sentido, restando apenas a morte para ele. Nesse momento, Axler se encontrou em uma encruzilhada na qual necessitava de uma mudança radical na sua vida para que pudesse continuar em frente.

Ao se aproximar da filha de antigos amigos — uma lésbica vinte e cinco anos mais nova do que ele, que passava por um momento parecido com o de Axler no sentido de se encontrar em uma encruzilhada, sem saber que caminho tomar — os dois acabam vivendo um romance nada convencional.

Cena do filme A Humilhação


Algumas questões permeiam a obra, deixando o leitor em suspenso, podendo ser citadas: que humilhação é essa que dá o título à história? Será que Axler voltará a atuar?

Philip Roth desenvolveu uma história envolvente e profunda sobre a tentativa daqueles que viveram como reis, sempre com a sensação de que poderiam fazer qualquer coisa, de se reerguerem após a queda e o mergulho em uma realidade frustrante.

Nota: 8.

domingo, 10 de setembro de 2017

A longa Marcha, de Stephen King


Capa do livro A longa Marcha, de Stephen King


Stephen King publicou alguns de seus livros com o pseudônimo de Richard Bachman. Segundo ele, o objetivo era testar o quão era capaz de vender livros sem a influência de seu nome; ou seja, ele queria saber até que ponto era capaz de criar boas histórias sem que a sua fama influenciasse a avaliação do leitor. A Longa Marcha foi um desses livros.

Publicado em 1979, se tornou um dos livros preferidos entre os leitores de King, sempre citado entre os melhores nas diversas listas publicadas na internet.

Fotografia de Stephen King


Resenha de A longa Marcha, de Stephen King

A história pode ser considerada uma distopia, pois ela se passa em um futuro sombrio;nou seja, difere da visão de futuro no qual a humanidade estaria caminhando a passos largos para um mundo melhor, no qual a humanidade finalmente realizaria o sonho do paraíso na Terra.

Na história, somos apresentados, logo no início, ao personagem Garraty, um rapaz de 17 anos nascido e criado no Maine, que se prepara para participar de um reality show intitulado "A Longa Marcha".

Basicamente, o reality show se resume a um grupo de 100 jovens entre 15 e 18 anos que iniciam uma caminhada no estado do Maine, indo em direção ao sul da América. Os competidores não podem parar de andar e nem sair da estrada. Cada vez que, por qualquer motivo, algum jovem para de andar, ele é advertido; e, após três advertências, é eliminado. O último que continuar andando vence e ganha o prêmio, que é o que ele quiser.

A Longa Marcha é transmitida pela televisão, sendo o evento de maior audiência na TV americana. Ao longo do trajeto, milhares de americanos se posicionam na beirada da estrada para acompanhar ao vivo a marcha; ou seja, é o principal evento de entretenimento dos Estados Unidos.

Arte do livro A longa Marcha, de Stephen King. Uma estrada e pessoas cansadas caminhando

O que torna a Longa Marcha terrível é o fato de que todo jovem que não consegue mais andar é literalmente eliminado. Soldados armados de metralhadoras acompanham o trajeto dos garotos, sendo responsáveis por aplicar as advertências e eliminar, através de uma saraivada de balas, os competidores que, porventura, parem.

Durante a leitura, duas questões se apresentam ao leitor, sendo elas: por que jovens aceitariam participar de um reality show desses? E por que as pessoas gostariam de acompanhar esse entretenimento macabro?

Stephen King vai, no transcorrer das páginas, contando aos poucos a história de vida dos principais personagens, mostrando como e por que eles se inscreveram na Longa Marcha; junto a isso, ele vai, ao descrever os espectadores da caminhada, mostrando o quão capazes são as pessoas de, apesar desse verniz de racionalidade e civilização, cultuarem o grotesco e o sórdido.

Fica evidente que os espectadores acompanham a marcha com a expectativa de ver os rapazes serem eliminados, e ficamos a todo o momento com a impressão de que eles perderam a noção de que aquilo é real; ou seja, não são mais capazes de separar a fantasia da realidade.

O livro é muito bom, sendo capaz de prender a atenção do leitor até o seu desfecho. O curioso é que o leitor acaba partilhando com a multidão da posição de espectador desse entretenimento macabro, torcendo por determinados personagens e odiando outros.

A Longa Marcha é uma história incrível e envolvente como só Stephen King é capaz de criar, sendo um livro fundamental para os fãs do gênero do terror.

Nota: 9.

Gosta de Stephen King? Leia outras resenhas de obras do autor:
Mr. Mercedes, de Stephen King;
IT: A Coisa, de Stephen king.







segunda-feira, 21 de agosto de 2017

O sonho de um Homem Ridículo, de Fiodor Dostoievski


Capa de O sonho de um Homem Ridículo, de Fiodor Dostoievski


O Sonho de um Homem Ridículo é uma narrativa fantástica publicada por Dostoiévski em 1877, em uma revista mantida pelo autor. A história pode ser considerada um conto devido ao seu tamanho, de cerca de trinta páginas. Na edição da Editora 34, foi publicada juntamente com o conto "A Dócil", sendo ambas narrativas que envolvem o tema do suicídio.

Resenha de O sonho de um Homem Ridículo, de Fiodor Dostoievski 

Apesar de tratar de um tema bastante real, a narrativa é considerada fantástica pois, após um sonho extremamente vívido, porém irreal, o personagem decide mudar o rumo de sua vida.

A história é narrada em primeira pessoa por um homem que não só é tido como ridículo por aqueles que o conhecem, mas que também se considera ridículo. O fato de rirem dele e fazerem de seus hábitos motivos de chacota apenas confirma uma visão extremamente depreciativa que ele tem de si mesmo. Contudo, tudo muda após ele chegar ao fundo do poço e decidir cometer suicídio.

Pintura simbolizando um homem atormentado no inferno

O desejo de cometer suicídio surge após a constatação de que ele não era nada e que tudo no mundo também não era nada; ou seja, para ele tudo era indiferente. Com isso, não havia razão para continuar vivo, haja vista que nada fazia sentido ou valia a pena.

Antes de cometer o suicídio, ele adormece em sua poltrona, tendo um sonho no qual ele, após cometer suicídio, é carregado por um ser até um outro planeta Terra. Nesse planeta Terra, os seres humanos são perfeitos e vivem uma vida livre de doenças e crimes. Nessa Terra, todos trabalham pelo bem comum e se amam, sem haver espaço para qualquer tipo de distinção social. Nesse lugar, em uma dimensão paralela à nossa, o pecado original — ou seja, o pecado de Adão e Eva — não ocorreu. Com isso, os seres humanos não tiveram a sua perfeição corrompida.

Apesar de se maravilhar com esse mundo perfeito, o personagem, longe de compartilhar essa perfeição, questiona o fato de eles não possuírem a nossa ciência. O fato de não serem contaminados com o pecado e serem plenamente felizes fez com que não sentissem a necessidade do conhecimento que move a nossa humanidade, além do fato de não terem a necessidade de transformar a vida deles. Eles, vivendo uma vida perfeita, não tinham a necessidade de criar leis para os guiar até um mundo melhor.

Também a relação deles com a natureza é totalmente diferente da relação que mantemos com ela. Enquanto buscamos dominá-la e transformá-la, eles buscavam um relacionamento orgânico com a natureza.

Desenho de uma pessoa deitada com o coração partido

Sendo imperfeito, o personagem sentiu a necessidade de tentar impressioná-los com as maravilhas do nosso mundo e, com isso, acabou pervertendo-os.

Ele lhes ensinou a mentira, a volúpia, o ciúme, entre outros. Com isso, eles começaram a lutar entre si, gerando um mundo violento, tal como o nosso. Conforme o caos foi tomando esse planeta, eles começaram a criar leis para tentar contornar esse mal. Com isso, surgiu a justiça e a organização social segundo uma série de regras estabelecidas pelos governos. Eles se esqueceram de que já foram inocentes um dia e começaram a buscar, através da ciência, um mundo perfeito. A busca por esse mundo melhor através do conhecimento esbarrou nos desejos individuais de cada um, e guerras foram travadas em nome de um mundo melhor.

Ele tentou exortá-los a retornarem para aquela essência perdida no passado — essência essa que não se conquista com a ciência criada pelo homem —, mas eles não acreditavam mais nessa essência e o ignoraram.

O Homem Ridículo acordou do sonho transformado, com a convicção de que as pessoas podem ser felizes na Terra, pois o mal não é o estágio inicial do homem; a humanidade nasceu da perfeição e tem, na sua origem, o amor como principal meta de vida.

Com isso, ele passou a desconfiar da capacidade de a ciência transformar o mundo, pois não somos fruto de uma evolução como ele acreditava antes. Ou seja, não estamos evoluindo de um estágio primitivo para um estágio superior através da ciência, mas sim partimos de um estágio superior para um inferior devido ao fato de depositarmos as nossas esperanças no conhecimento do homem, esquecendo nossa origem divina e perfeita.

sábado, 12 de agosto de 2017

A garota no trem, de Paula Hawkins


Capa do livro A garota no trem, de Paula Hawkins


A Garota no Trem, romance de estreia da escritora inglesa Paula Hawkins, é um thriller policial publicado no ano de 2015. Seu sucesso, sendo comparado ao romance "Garota Exemplar", rendeu fama a Hawkins e a adaptação da história para o cinema.

Resenha de A garota no trem, de Paula Hawkins

O romance tem por protagonista uma mulher na casa dos trinta anos, chamada Rachel, que passa pelo pior momento da sua vida. Seu casamento fracassou devido ao seu vício em bebidas e à impossibilidade de engravidar; e, para completar, ela perdeu o emprego após chegar bêbada ao trabalho.

Cena do filme A garota no trem. Uma mulher olhando pela janela


Ela mora na casa de uma amiga de faculdade e passa seus dias tentando esconder de todos a perda do emprego e o seu vício em bebidas. Para tanto, todos os dias de manhã, ela pega o trem na cidade em que mora e viaja até Londres, onde ficava o seu antigo trabalho, passando o dia vagando pela cidade para, no fim do dia, retornar para a cidade em que mora. Com isso, todos que a conhecem acham que ela continua trabalhando.
Nesse trajeto diário de trem, ela passa na frente da casa em que morou antes da separação; atualmente, seu ex-marido mora com a atual esposa no local. Apesar da separação, Rachel não consegue esquecer seu ex-marido e sua antiga vida; com isso, fica perseguindo-o, principalmente nos momentos em que está bêbada.

Rachel tem por principal passatempo ficar observando pela janela do trem as paisagens do trajeto, sempre imaginando como seria a vida das pessoas que ela observa. Um jovem casal, Tom e Megan, que comprou a casa vizinha à sua antiga casa, chama a atenção de Rachel devido à beleza do casal, além da sintonia que os dois demonstram nos raros momentos em que Rachel consegue avistá-los do trem.

Essa rotina de Rachel muda após ela ver a mulher idealizada beijando outro homem em um bar. Dias depois, em um de seus momentos de embriaguez, Rachel vai até a casa de seu ex para confrontá-lo. No dia seguinte, ela não se lembra de nada do que aconteceu na noite anterior. Contudo, a notícia de que Megan desapareceu na noite anterior faz com que Rachel suspeite de que tenha visto algo enquanto passava pela rua em que eles moram.

Rachel, apesar de nunca ter tido contato com o casal, se solidariza com a tragédia, principalmente com o marido, que é tido como o principal suspeito. Com isso, ela decide ajudar na solução do desaparecimento de Megan, envolvendo-se diretamente na trama.

Cena do filme A garota no trem. uma mulher andando na estrada sozinha



O romance é narrado em primeira pessoa por três personagens femininas, sendo elas: Rachel, Megan e Anna (atual esposa do ex-marido de Rachel). A narrativa se dá em formato de diário, sempre com cada uma delas contribuindo com uma peça do quebra-cabeça da história. O interessante desse formato de narrativa é que ele proporciona três olhares diferentes sobre o que está acontecendo na trama, auxiliando o leitor na compreensão do enredo. Contudo, o leitor deve ficar atento para o fato de que nem sempre o relato de cada uma delas poderá ser tomado como verdade; inclusive, uma acaba sempre contradizendo a visão da outra.

O romance é claramente inspirado no filme "Janela Indiscreta", de Hitchcock; contudo, a autora foi capaz de dar vida própria à sua história, sendo uma boa história policial, capaz de prender o leitor, que em nenhum momento se cansa da leitura. Sem dúvida, um bom livro do gênero policial.

Nota: 8.





sábado, 5 de agosto de 2017

Não conte a ninguém, de Harlan Coben


Capa do livro Não conte a ninguém, de Harlan Coben

Harlan Coben é um dos escritores americanos mais lidos na atualidade. Seus livros vendem milhões de cópias, tornando-se facilmente best-sellers. Seu estilo de escrita é simples, buscando, com imagens impactantes em sequência e sem perder muito tempo com reflexões, gerar um clima de suspense eletrizante. Com isso, seus livros têm por principal característica a fácil assimilação por parte do leitor.

Cena do filme Não conte a ninguém, de Harlan Coben. Homem e mulher diante de um computador



O romance "Não Conte a Ninguém", publicado originalmente em 2001, é um thriller policial capaz de tirar o fôlego do leitor que acompanha, no transcorrer da história, o desenrolar de uma trama que se inicia como um conto de fadas para rapidamente se converter em um pesadelo.

Resenha de Não Conte a Ninguém

Um jovem casal apaixonado é atacado por um assassino em série no dia do aniversário de namoro. Apenas o rapaz, o doutor David, sobrevive, vivendo os posteriores oito anos de sua vida sem superar a tragédia, mesmo sabendo que o assassino foi julgado e condenado.

Tudo muda no dia do aniversário de namoro dos dois, quando David recebe um e-mail que o leva a crer que sua mulher está viva. Junto a isso, o surgimento de dois corpos próximos ao local onde ele e sua mulher foram atacados faz com que a polícia reabra o caso, sendo David o principal suspeito de matar a sua mulher.

Enquanto David investiga a origem daqueles e-mails e enfrenta as acusações da polícia, um poderoso homem de negócios, ligado a atividades criminosas, coloca seus homens na cola de David por motivos que David desconhece. Com isso, temos as peças que compõem o quebra-cabeça da trama.

A história é narrada, na maior parte do livro, em primeira pessoa por David, que vai aos poucos desvendando o mistério que o cerca, enquanto foge da polícia e da organização criminosa. O leitor partilha da confusão vivida por David, descobrindo aos poucos os motivos por trás dos e-mails e de sua perseguição.
Cartaz do filme Não conte a ninguém


O título está relacionado a uma exigência feita por quem está mandando os e-mails para David: a exigência de ele não contar a ninguém sobre o que estava acontecendo. Com isso, fica evidente que todos são suspeitos e David não pode confiar em ninguém.

O romance "Não Conte a Ninguém" é um bom thriller policial, fazendo jus à fama de Coben de criar histórias capazes de envolver o leitor até as últimas páginas, sendo uma leitura leve, prazerosa e descompromissada.

Nota: 8.

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

O caso Morel, de Rubem Fonseca


Capa do livro O caso Morel, de Rubem Fonseca


Rubem Fonseca é considerado um dos grandes nomes da literatura brasileira contemporânea. Vencedor de diversos prêmios, é autor de uma vasta obra iniciada nos anos 60. Nascido em 1925, em Minas Gerais, cursou Direito no Rio de Janeiro e Administração no estrangeiro. Trabalhou, entre outros, como policial e crítico de cinema antes de se dedicar inteiramente à literatura.

Sua produção tem por principais temas o sexo e a violência presentes no meio urbano. Ele trabalhou esses temas tabus de forma direta e crua, causando grande impacto nos leitores acostumados a uma reprodução do cotidiano pela arte de forma filtrada pelos valores moralizantes presentes na sociedade.

Fotografia de  Rubem Fonseca

Resenha de O caso Morel 

O Caso Morel, publicado em 1973, é um exemplo do quão impactantes são as obras de Fonseca. No romance, ele se utilizou da literatura policial como pano de fundo para compor uma história repleta de carga emocional, tendo por protagonista Morel: um artista preso por um crime do qual o leitor não tem informações. Com isso, o mistério em torno de sua prisão prende o leitor, que acompanha a reconstituição da vida de Morel até a sua detenção.

A história é narrada por três perspectivas, sendo elas:

Morel, que reconstitui sua vida até a sua prisão;

Uma narração em terceira pessoa, nos momentos de Morel na cadeia;

A narração em primeira pessoa por um outro personagem que acompanha a reconstituição da vida de Morel.

A narrativa do livro faz com que fiquemos com a impressão de que lemos um livro dentro de outro livro. Ou seja, temos um narrador contando uma história e, dentro dessa história, temos a narrativa de Morel. Enquanto está preso, Morel decide escrever um romance baseado em suas experiências; com isso, pede o auxílio de um escritor experiente para avaliar seus escritos. O contato com o escritor é facilitado pela polícia, que acredita que Morel irá revelar detalhes do seu crime na obra.

Com isso, enveredamos pela reconstituição da vida de Morel até a sua prisão. Morel é um pintor respeitado, contudo desiludido com a vida e com a arte. Ele passa a maior parte do seu tempo vagando pelo Rio de Janeiro em busca de sentido para a sua vida. Temos contato com suas aventuras amorosas. Cansado das regras sociais impostas — o romance foi escrito no auge da Ditadura Militar — Morel busca criar um novo tipo de família, que destoa totalmente do modelo de família difundido na sociedade. Para tanto, ele convida quatro mulheres para morarem com ele, formando, assim, uma família baseada na total liberdade moral e sexual.

As quase duzentas páginas do romance são preenchidas ora com as aventuras amorosas de Morel, ora com suas divagações acerca da falência da arte e da liberdade individual, devido à avalanche cultural em um país dominado por um regime autocrático e censurador, pautado na moralização da sociedade segundo valores cristãos deturpados.

Morel apresenta-se como um sobrevivente em um mundo desprovido de sentido para um artista que tem por único compromisso a liberdade artística. Nesse mundo castrador, as pulsões humanas são postas de lado em favor de uma falsa decência que poda a liberdade humana.

Fotografia do Rio de Janeiro nos anos 70


O romance cumpre com o prometido; Morel, a cada página, choca o leitor, pois suas depravações parecem não ter fim.

Este romance traz à tona a natureza humana de forma livre, sem compromisso com qualquer tipo de censura moral. Talvez nos dias atuais, nos quais a censura direta está superada — apesar de continuar a existir uma censura velada — o romance possa não ter o mesmo poder de impactar o leitor já acostumado com uma maior liberdade sexual. Contudo, dificilmente as aventuras de Morel deixarão de causar estranheza e questionamentos sobre a natureza humana em todos aqueles que se aventurarem na leitura do livro.

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Prelúdio da Fundação, de Isaac Asimov


Capa do livro Prelúdio da Fundação, de Asimov


Prelúdio à Fundação é um livro pertencente à série "Fundação" escrito por Asimov no ano de 1988. Asimov, sendo um dos maiores autores da ficção científica mundial, foi autor da série "Fundação", reconhecida por parte da crítica especializada como a melhor série de ficção científica e de fantasia de todos os tempos. 

A série Fundação tem uma ordem de lançamentos que diverge da ordem dos acontecimentos, porquanto Asimov, nos anos 50, escreveu os três livros que, para ele naquela época, comporiam a série Fundação, sendo eles: Fundação, Fundação e Império e Segunda Fundação. Contudo, anos depois, devido à pressão de fãs, decidiu expandir a série escrevendo dois outros livros que se passam após os acontecimentos narrados nos três livros iniciais, sendo eles: Limites da Fundação e Fundação e Terra.

Nos anos oitenta, Asimov decidiu escrever mais dois livros que se passam antes dos acontecimentos dos três primeiros livros, sendo eles: Prelúdio à Fundação e Origens da Fundação. Com isso, levando-se em consideração a ordem dos acontecimentos, a série Fundação possui a seguinte ordem: 
Prelúdio à Fundação, Origens da Fundação, Fundação, Fundação e Império, Segunda Fundação, Limites da Fundação e Fundação e Terra.

Resenha de Prelúdio à Fundação

A série é ambientada em um futuro distante no qual o planeta Terra não existe mais e a humanidade foi obrigada a habitar diversos planetas de uma galáxia onde existem condições propícias para a vida humana. O sistema político vigente da galáxia é o Império, estando toda a galáxia subordinada ao imperador que vive em seu palácio no planeta Trantor, planeta sede do Império.

O planeta Trantor é o mais importante e desenvolvido da galáxia. Ele é quase todo recoberto por uma cúpula que o protege das intempéries do tempo. Com isso, a condição climática do planeta é produzida artificialmente. Além disso, eles contam com naves que voam na velocidade da luz e elevadores muito parecidos com aqueles da série Futurama, nos quais a pessoa é sugada por um tubo.

Psico-história


Nesse mundo futurista, um matemático chamado Hari Seldon desenvolve os princípios de uma união entre matemática e comportamento social, chamada por ele de psico-história. Para ele, a psico-história seria capaz, através de cálculos matemáticos, de prever os possíveis futuros, segundo as decisões que a humanidade tomasse. Essa psico-história chama a atenção dos poderosos, inclusive do imperador Cleon I, que deseja utilizar Seldon como um oráculo, com o intuito de manipular a ciência para atender aos seus desejos. Com ajuda de um homem misterioso chamado Chetter Hummin, Seldon consegue escapar das garras do Imperador, tendo a possibilidade de desenvolver a psico-história.

Prelúdio à Fundação é o primeiro livro da série, porém, em ordem de lançamento, é o penúltimo publicado. Nele, temos contato com Seldon jovem, ainda em vias de desenvolver a psico-história. Apesar de a mesma ainda não estar efetivada, ela já desperta o interesse de diversos poderosos que querem se utilizar dela para seus propósitos.

Com a ajuda de Hummin e Dors Venabili — uma historiadora que toma para si a tarefa de proteger Seldon durante a fuga — Seldon empreende uma jornada pelo planeta de Trantor, tendo em seu encalço os homens do Imperador Cleon e outros poderosos que querem se apoderar de Seldon e sua psico-história.

Reprodução de uma cidade futurista

Prelúdio à Fundação é centrado na fuga de Seldon, juntamente com as primeiras tentativas do matemático de desenvolver a psico-história. Ao longo de sua fuga, Seldon passa por diversas regiões do planeta Trantor, cada região com uma cultura própria. A força do livro está na descrição dessas regiões, bem como nas confusões que aguardam Seldon em cada uma delas. Pode-se destacar: uma região em que todos os habitantes raspam todos os pelos do corpo, inclusive do couro cabeludo. Para eles, os pelos do corpo são extremamente eróticos, sendo indecente mostrá-los em público. Outra curiosidade sobre essa região é que, apesar de não existir religião, todos os habitantes carregam consigo um livro que conta a história daquele povo quando habitavam um outro planeta chamado Aurora, em uma época em que todos os seres humanos habitavam um único planeta.

Outra região que chama a atenção é uma área periférica do planeta, podendo ser considerada uma região subdesenvolvida dominada pela violência. Nela, Seldon e Dors passam por diversos perigos, além de visitarem uma mulher considerada uma vidente. Através dela, eles têm contato com a lenda de que a raça humana surgiu inicialmente em um único planeta, chamado Terra. Segundo ela, nesse planeta existiam robôs que se pareciam com os humanos, ou seja, inteligência artificial.

Neste primeiro livro, não temos muito contato com a psico-história, sendo a história centrada na fuga de Seldon, personagem carismático, assemelhando-se muito ao personagem Sr. Pickwick, de Dickens. Seldon é um matemático extremamente inteligente, porém deslocado da realidade. Com isso, é incapaz de perceber os perigos que o cercam, além da necessidade de seguir as convenções sociais. As confusões em que ele se mete rendem momentos engraçados que, juntamente com a descrição dos lugares por onde passa, fazem com que a leitura seja muito agradável.

Fundação é uma série de ficção científica que empolgou e continua a empolgar leitores por todos os cantos da galáxia, sendo uma leitura fundamental para os fãs do gênero.
Aproveite e leia a nossa resenha de outro clássico da ficção científica: O caçador de Androides, de Philip Dick





sexta-feira, 16 de junho de 2017

Mr. Mercedes, de Stephen King



Capa do livro Mr. Mercedes, de Stephen King


O romance, publicado em 2013, foge da temática que consagrou Stephen King como o mestre do terror contemporâneo. Neste romance, King desenvolveu o famoso modelo de romance policial centrado na dualidade entre o herói, um policial aposentado, e um vilão, que se julga superior a tudo e todos.

Desenho de um homem segurando uma arma

Resenha de Mr. Mercedes


Logo no começo do romance, entendemos o porquê de se chamar Mr. Mercedes. Um assassino em série pratica um atentado atropelando, com um Mercedes, pessoas que estavam em uma fila de emprego. O detetive Hodges, prestes a se aposentar, investiga o atentado sem ser capaz de achar o culpado.

Algum tempo após a aposentadoria, vivida entre ficar na frente da televisão e pensar em suicídio, Hodges recebe uma carta do assassino do Mercedes. Nessa carta, o assassino zomba de Hodges e o convida a tentar, mais uma vez, pegá-lo. Hodges não leva a carta à polícia, tomando para si a missão de pegar o assassino do Mercedes.

Esse tipo de romance policial difere do tipo consagrado por Agatha Christie, que era centrado no mistério de descobrir quem é o assassino. No livro de King, logo nas primeiras páginas temos contato com o assassino, sabendo os seus motivos, bem como os seus futuros planos. Com isso, a emoção está presente na caçada, ora empreendida pelo detetive aposentado Hodges, ora pelo próprio assassino, que planeja matar Hodges.
Desenho de guarda-chuva

O livro se desenvolve em um ritmo acelerado, sendo essa uma característica dos romances policiais, sem se alongar nas descrições, privilegiando, com isso, a ação. O romance é repleto de clichês, tais como: o policial aposentado depressivo, o assassino com complexo de Deus, policiais totalmente perdidos ou sem muito interesse em ouvir o detetive aposentado, etc.

Apesar desses clichês, a história se desenrola de forma agradável e emocionante, perdendo um pouco o rumo na segunda metade, onde uma série de acontecimentos coloca em xeque a decisão do detetive aposentado de deixar a polícia de fora, inclusive colocando a vida de um adolescente e de uma mulher com problemas mentais em risco, devido à teimosia — não explicada de forma consistente — de deixar a polícia de fora.

No geral, o livro é bom e o leitor tem tudo para se sentir preso pela história até o seu desfecho; contudo, sem dúvida, existem romances policiais superiores a Mr. Mercedes.







domingo, 9 de abril de 2017

O dia da Caça, de James Patterson


Capa do livro O dia da Caça, de James Patterson


James Patterson é um dos autores mais lidos na atualidade. Seus livros estão entre os mais vendidos em listas publicadas por jornais americanos. Entre as suas publicações, podemos destacar a série "Alex Cross", além da série "Clube das Mulheres contra o Crime". Segundo blogs pesquisados, ele já publicou mais de vinte livros da série "Alex Cross", que tem por protagonista um detetive da polícia de Washington que se envolve nas mais variadas tramas policiais imagináveis.

Cena do filme O dia da Caça

Resenha de O Dia da Caça


No romance "O Dia da Caça", publicado em 2008, o detetive Cross se vê diante de uma série de assassinatos ocorridos na capital americana, tendo por principais características a brutalidade dos crimes — ocorrendo mutilações — e o fato de se tratarem de assassinatos de famílias inteiras, não sendo poupadas nem as crianças.


Cena do filme O dia da Caça

"O primeiro piso contava uma história macabra, que desenhava os contornos da matança. Quase todos os móveis das salas de estar e de jantar tinham sido virados ou destruídos, ou as duas coisas. Havia alguns buracos enormes nas paredes e dezenas de outros menores. Um candelabro de vidro antigo estava estilhaçado no chão, os cacos espalhados sobre um tapete oriental colorido".


Uma das famílias assassinadas tinha por mãe uma antiga namorada de Cross; com isso, a resolução desses homicídios se torna algo pessoal para Cross, que começa a seguir a pista do grupo de assassinos. Essa pista o leva até o continente africano, onde ele se envolve em uma trama envolvendo o serviço secreto americano, além de uma sangrenta guerra civil.

A leitura do livro discorre de forma tranquila, tendo o mesmo, na versão em português da Editora Arqueiro, 190 páginas. A narrativa segue um mesmo fluxo, tendo por receita parágrafos curtos e capítulos curtos — sendo que o livro tem incríveis 158 capítulos. Ou seja, quase um capítulo por página.

As cenas são narradas de forma rápida, sem tempo para qualquer tipo de reflexão por parte do personagem principal. O livro é narrado em primeira pessoa, podendo ser citado o exemplo de que o autor narrou uma invasão e consequente matança de um grupo de assentados em uma única página. Com isso, é uma leitura que não exige muito do leitor e, apesar de conter cenários do continente africano, não proporciona nenhum tipo de conhecimento ou reflexão profunda sobre o que está sendo lido. O livro pode ser considerado uma leitura leve voltada para um puro divertimento, sem muitas pretensões.

O preço do livro, bem como a agilidade da narrativa, faz com que o mesmo seja uma boa opção para quem deseja se divertir sem um grande investimento de tempo e dinheiro.
















terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

IT: A Coisa, de Stephen king

Capa do livro IT: A Coisa, de Stephen king

O romance, publicado em 1986 por Stephen King, gira em torno de um grupo de amigos unidos pela promessa de destruir uma poderosa força maligna que assola a cidade de Derry, no Maine. Essa cidade fictícia foi palco de outros romances de King, entre eles: Insônia, Saco de Ossos e O Apanhador de Sonhos.

Imagem do filme IT: A Coisa. Um palhaço com garras

Resenha de It


Um grupo de crianças, devido à adversidade de serem perseguidas por um valentão chamado Henry Bowers, cria um grupo intitulado "Clube dos Perdedores" e se reúne em uma área florestada da cidade para brincar e se proteger dos valentões da cidade.

Contudo, os valentões não são o único perigo ao qual as crianças estão sujeitas. A cada cerca de 27 anos, assassinatos brutais, principalmente de crianças, ocorrem na cidade sem que ninguém descubra o assassino. Relatos de crianças apontam para a existência de um palhaço assustador habitando nas tubulações do esgoto da cidade, mas os adultos não dão muito crédito a esses relatos, não relacionando-os com as mortes.

O assassinato de George, irmão de Bill Denbrough — um membro do Clube dos Perdedores —, juntamente às experiências paranormais vivenciadas pelos membros do clube, faz com que eles decidam se unir para combater essa entidade que se apresenta, entre outras formas, na figura de um palhaço.

"George esticou a mão. O palhaço agarrou seu braço. E George viu o rosto do palhaço mudar. O que ele viu então era terrível o bastante para fazer suas piores fantasias da coisa no porão parecerem doces sonhos; o que ele viu destruiu sua sanidade em um golpe de uma garra".

Cena do filme IT: A Coisa. Um palhaço com balões

Apesar de a narrativa iniciar-se nos anos cinquenta com a morte do irmão de Bill, ela se desenrola, no começo, cerca de vinte anos depois, mostrando os membros do clube na fase adulta de suas vidas. Todos os membros do clube, com exceção de um, não residem mais na cidade e nem se lembram do Clube dos Perdedores. O membro que permaneceu na cidade, Mike Hanlon, ficou com o encargo de vigiar no caso de a coisa retornar, pois todos os membros, ao enfrentarem a coisa quando crianças, fizeram a promessa de retornarem para enfrentá-la caso ela retornasse.

Esse dia chegou, e Mike liga para todos os membros do clube lembrando-lhes da promessa feita vinte anos antes. Com isso, a narrativa se desenrola nos anos oitenta com os membros do clube se dirigindo para a cidade, acompanhada de muitos flashbacks deles crianças. Tanto o enfrentamento da entidade chamada por eles de "a Coisa" na infância quanto na fase adulta são narrados na parte final do livro. Com isso, King vai durante todo o romance narrando paralelamente os acontecimentos dos dois momentos da vida dos personagens.

Principalmente nos relatos da infância dos personagens, King vai revelando a personalidade, bem como os medos de cada membro, fazendo com que o leitor crie um laço de afetividade com eles. Com isso, a história não se resume apenas ao enfrentamento da Coisa, mas também ao processo de amadurecimento e aos vínculos proporcionados pela amizade deles. As experiências vivenciadas por essas crianças são fundamentais para o entendimento dos adultos nos quais elas se tornaram e para o sucesso na empreitada de destruir a Coisa.

O romance pode ser um desafio para o leitor devido ao seu tamanho, bem como à narrativa em flashbacks; contudo, o romance pode ser considerado uma das melhores histórias do gênero do horror já escritas, sendo uma leitura obrigatória para qualquer fã do gênero.


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quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

O processo, de F. Kafka


Capa de O processo, de F. Kafka

Nesse romance de Kafka, o leitor é carregado por caminhos tortuosos e desconhecidos. Durante esse trajeto, somos tragados junto ao personagem, sem a possibilidade de escapatória, pela engrenagem organizacional de um sistema público extremamente contraditório.

Resenha de O Processo


Nessa viagem, o leitor acompanha as desventuras de Josef K., que vivia uma vida tranquila, segura e livre de surpresas. Josef possuía um bom emprego em um banco, emprego que lhe possibilitava um local de trabalho organizado e seguro, compatível com a sua personalidade meticulosa. Essa vida confortável começa a mudar após, na manhã do seu aniversário de trinta anos, receber a comunicação de que estava sendo processado.

De início, Josef desacredita da existência desse processo, pensando estar sendo alvo de algum tipo de brincadeira. Essa atitude demonstra que ele não reconhece nenhum tipo de falta no seu comportamento que justifique um processo.

"É certo que, bem considerado, tudo isto não podia deixar de ser uma brincadeira pesada, a qual, por razões desconhecidas, talvez pelo fato de que hoje K. completava trinta anos, seus colegas de banco haviam organizado".

Contudo, não se tratava de brincadeira; Josef realmente está sendo processado por uma justiça que ele desconhece por completo. Ao ter o primeiro contato com essa justiça, Josef facilmente reconhece o caráter absurdo dela. Os responsáveis por intimá-lo em sua casa são tomados pelo mesmo como artistas de rua contratados para enganá-lo. Para ele, tudo não passa de uma farsa; com isso, não demonstra preocupação com o desenrolar do seu processo.

Tudo muda ao ser intimado a comparecer em seu primeiro interrogatório. Acreditando ter nesse interrogatório a oportunidade de esclarecer o motivo de seu processo, bem como encerrar o mesmo, Josef chega ao prédio de justiça confiante. Contudo, o interior do mesmo, bem como os funcionários públicos, fazem com que ele se sinta confuso, sendo que, para ele, essa justiça se mostra destituída de sentido e corrupta.

"Qual é a finalidade desta grande organização, meus senhores? Consiste em deter inocentes e em mover-lhes um processo insensato e, na maioria das vezes, como é o meu caso, carente completamente de resultados".

Essa justiça se apresenta para ele destituída de significado, porquanto torna a tarefa de defesa do acusado quase impossível, pois o mesmo desconhece o motivo de seu processo e os agentes dessa justiça tampouco buscam esclarecê-lo.

A repartição pública na qual desempenham suas funções é apresentada como um local de pesadelo. O ambiente é degradante, como se espelhasse a personalidade dos agentes públicos. Sua hierarquização em repartições é destituída de sentido e ordem, servindo apenas como forma de legitimar o poder de uns sobre os outros. Sua lei é baseada no poder, estando o acusado no último degrau dessa escada. Com isso, para fugir de uma possível condenação, ele não deve se amparar na lei, mas sim se utilizar de meios escusos para tanto.

Josef, ao ter contato com essa organização, decide se manter distante da mesma, buscando retornar para a sua vida normal. Contudo, sua vida começa a ser afetada pelo processo, pois este se configura como uma mancha na sua honra, necessitando ser solucionado. Devido à influência de seu tio, Josef procura um advogado. Esse advogado, um estudioso das leis e conhecedor da justiça, se mostra incapaz de traduzi-la para Josef de forma racional e ordenada.

Um pesadelo acordado


Josef vai aos poucos sendo sugado por esse novo mundo que surge diante de seus olhos; todo o seu conhecimento e racionalidade são inúteis diante de tal justiça, porquanto a mesma não tem sentido. Nessa justiça, o acusado não tem acesso ao seu processo, impossibilitando, com isso, uma defesa. A absolvição se mostra quase impossível, podendo o acusado apenas retardar ao máximo sua condenação.

"...no fundo a lei não admitia nenhuma defesa, mas tão somente a tolerava e até parecia perguntar-se se verdadeiramente não seria mister pôr em tela de juízo aqueles pontos dos códigos segundo os quais teria ao menos de admitir a defesa".

Desenho de um homem escrevendo com uma expressão de assustado

Com isso, a justiça não se mostra como uma possibilidade de resolução de conflitos advindos da vida em sociedade, mas sim como uma organização à parte da sociedade, com suas próprias regras, que busca apenas se autossustentar. Para tanto, é organizada de forma a sugar o acusado, devendo seus funcionários tirarem o máximo proveito das vantagens sobre o acusado. Nessa engrenagem corrupta e destituída de sentido, orbitam não somente funcionários públicos, mas também crápulas que se aproveitam de suas relações para tirar proveito.

Configura-se uma rede de relações entre os mais variados degraus dessa hierarquia, onde a verdade é apenas um detalhe, sendo esses homens — tidos como conhecedores da justiça — movidos pelas necessidades mais egocêntricas, tais como a necessidade de se autopromover e a necessidade de dominação sobre o próximo.

"...o cliente terminava por esquecer-se de todo o mundo e arrastar-se seguindo caminhos incertos, com a esperança de alcançar o término do processo. Então já não era um cliente, mas o cachorro do advogado. Se este lhe tivesse mandado que se metesse debaixo da cama, arrastando-se, como se se tratasse da casinha do cachorro, e que dali ladrasse, o cliente o teria feito com satisfação".

Apesar de Josef tentar não ser influenciado pelo processo, ele vai sendo gradativamente sugado pelo sentimento de opressão e desconhecimento do novo mundo no qual está inserido; com isso, sua vida vai saindo dos eixos, perdendo o mesmo toda a segurança e parte de sua sanidade. A engrenagem de uma organização pública, fundamental para a vida em sociedade, vai tragando aqueles desafortunados que, por motivos desconhecidos, caem em suas amarras, sendo lentamente sugados pelo absurdo.

"Onde estava o juiz que nunca tinha visto? Onde estava o alto tribunal ante o qual nunca comparecera?"