terça-feira, 10 de maio de 2016

O retrato de Dorian Gray- Oscar Wilde



Capa do livro O retrato de Dorian Gray- Oscar Wilde

Em uma época em que prevalecia uma literatura realista permeada de valores vitorianos, onde se buscava retratar a dinâmica social e, em muitos casos, contestá-la, surge um movimento artístico cunhado de esteticismo, pautado pela apreciação da arte por ela mesma. Ou seja: enquanto os realistas buscavam uma utilidade social para a arte, os esteticistas buscavam apreciá-la como sendo o seu único fim. Com isso, surge o termo "arte pela arte".

"Toda arte é completamente inútil."

A vida tumultuada de Oscar Wilde — ele chegou a ser preso por atos indecorosos — demonstra bem sua concepção de vida. Wilde perseguia o belo, livre de quaisquer preconceitos ou convenções sociais. Em um mundo perverso e cheio de contradições, Wilde via a arte como subterfúgio da tristeza da existência humana.

"Posso simpatizar com tudo, menos com o sofrimento [...] Com isso não posso simpatizar. É demasiado feio, demasiado horrível, demasiado aflitivo. Há algo de terrivelmente mórbido na simpatia moderna pela dor. Devemos simpatizar com a cor, com a beleza, com a alegria da vida. Quanto menos se fale das chagas da vida, tanto melhor."

Resenha de O retrato de Dorian Gray


Em determinado trecho do romance, verifica-se toda a entrega do artista na produção artística. O artista transforma-se em escravo da arte, perseguindo um ideal que transcende o nível do real. No trecho a seguir, o artista, tendo a oportunidade única proporcionada pela história, tem a oportunidade de dialogar com sua criação:

"Para mim, você se converteu na encarnação visível desse ideal invisível que nos persegue a nós, artistas, como um sonho estranho. Foi devoção o que senti por você [...]. Queria você só para mim. Só era feliz quando estava com você. [...] Havia visto a perfeição face a face e o mundo se tornou maravilhoso demais."

Muitos utopistas buscaram transformar o social no intuito de se alcançar um mundo melhor; contudo, essa busca não gerou muitos frutos. Os esteticistas, ao deixarem de lado essa busca, concentraram-se na realização humana através da arte. No romance de Wilde, o artista, Basil Hallward, encontra no jovem Dorian Gray a perfeição física e a pureza mental muitas vezes somente encontradas na juventude — época em que os vícios ainda não corromperam a beleza humana. Com isso, decide imortalizá-lo em um retrato.

Ao término da confecção do retrato, surge o amigo de Basil, Sr. Henry Wotton. Ao contrário de Basil, que vive para a arte, o Sr. Wotton vive para seu prazer, manipulando e destruindo tudo que estiver no seu caminho. Ao se deparar com o jovem Gray, o Sr. Wotton vislumbra a possibilidade de, através de jogos psicológicos, moldá-lo e corrompê-lo.

"Estava de fato convencido de que o método experimental era o único pelo qual se podia chegar a uma análise científica das paixões, e Dorian Gray era, certamente, um indivíduo feito para as suas mãos e que parecia prometer ricos e frutuosos resultados."

"Influenciar uma pessoa é transmitir-lhe a nossa própria alma. Ela já não pensa com seus pensamentos naturais, nem arde com suas paixões naturais. As suas virtudes não são reais para ela. Os seus pecados, se é que existem pecados, são emprestados. Ela se converte em eco de uma música alheia, em ator de um papel que não foi escrito para ela."

O Sr. Wotton vai aos poucos corrompendo o jovem Dorian. Através de jogos psicológicos, destrói a pureza do jovem, lançando-o nos maiores vícios e quebrando todos os tabus sociais. Dorian passa a viver para o prazer, seja ele qual for, sem preocupar-se com os efeitos dessa busca sobre si mesmo e sobre os outros.

"Nunca procurei a felicidade. Quem no mundo deseja a felicidade? Procurei o prazer."

Retrato de Oscar Wilde

Sua jovem noiva, uma atriz pobre que o encantou pelo seu talento e beleza, comete suicídio após ser abandonada por Dorian. Ele demonstra não sentir remorsos pelo ocorrido, como se tivesse perdido a capacidade de medir as consequências de seus atos.

Todas essas experiências vivenciadas de forma inconsequente por Dorian não degradaram sua beleza física e mental. Ao passar dos anos, Dorian continuava jovem e sadio. Isso se deu graças a um pacto que o mesmo fez, ainda jovem, ao vislumbrar seu retrato finalizado por Basil. Ao contemplar o quadro, percebe que sua beleza transportada para a tela permanecerá intacta apenas ali, enquanto ele envelhecerá e perderá sua juventude.

"Como é triste! Tornar-me-ei velho, horrível, espantoso. Mas este retrato permanecerá sempre jovem."

Diante disso, Dorian faz um pacto, ofertando sua alma em troca de que, em vez dele, seu retrato suporte o peso do tempo e dos vícios adquiridos. Com isso, o retrato passa a envelhecer e guardar as marcas dos vícios de Dorian, enquanto ele permanece jovem e sadio. Ao fazer esse pacto, Dorian não simplesmente se livrou da degradação física, mas também de sua alma, porquanto nossa degradação serve de alerta para que possamos repensar nossa existência.

Com o tempo, a existência do retrato atormenta Dorian, porquanto contemplá-lo é como se estivesse contemplando sua própria alma. Dorian decide destruir o retrato para recuperar seu sossego.

"Mataria o passado e tornar-se-ia livre. Mataria aquela monstruosa alma visível e, sem suas hediondas advertências, recuperaria o sossego."

Contudo, Dorian não havia compreendido que, na verdade, seu retrato continha sua humanidade e, sem ele, Dorian não existiria.





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