sexta-feira, 24 de junho de 2016

Caetés- Graciliano Ramos



Capa do livro Caetés- Graciliano Ramos

Primeiro romance de Graciliano Ramos, publicado em 1933, Caetés tem por tema o cotidiano da classe média do interior nordestino na primeira metade do século XX. O romance é ambientado no município de Palmeira dos Índios, em Alagoas. O protagonista narra em primeira pessoa suas aventuras amorosas e a tentativa de lançar-se na carreira literária.

Resenha de Caetés

Inicialmente, sua paixão pela esposa de seu chefe apresenta-se como tema central do romance. O protagonista mostra-se uma pessoa sonhadora, vivendo com um pé na realidade e outro nas suas fantasias:

"Embrenhei-me numa fantasia doida por aí além, de tal sorte que em poucos minutos Adrião se finou, padre Anastácio pôs a estola sobre minha mão e a de Luíza, os meninos cresceram, gordos, vermelhos, dois machos e duas fêmeas. À meia-noite andávamos pelo Rio de Janeiro; os rapazes estavam na academia, tudo sabido, quase doutor; uma pequena tinha casado com um médico, a outra com um fazendeiro — e nós íamos no dia seguinte visitá-las em São Paulo."

Sua paixão pela esposa de seu chefe, aliada às suas fantasias, faz com que ele romantize Luíza, vendo-a como um ser perfeito, sem realmente enxergá-la como ela realmente era:
"Entretive-me durante um mês a orná-la com abundância de virtudes raras. Além das que ela possui, e que são muitas, dei-lhe outras. E lamentei que meu espírito minguado não pudesse conceber perfeições maiores para jogar sobre ela."

Com o desenvolvimento da história, sua tentativa de escrever um romance histórico acaba se destacando. Ele busca escrever um romance sobre os índigenas que habitavam a região alagoana antes da vinda dos portugueses. Contudo, encontra muitas dificuldades para terminá-lo:

"Também aventurar-me a fabricar um romance histórico sem conhecer história! Os meus Caetés realmente não têm verossimilhança, porque deles apenas sei que existiram, andando nus e comiam gente. Li, na escola primária, uns carapetões interessantes no Gonçalves Dias e no Alencar, mas já esqueci quase tudo. Sorria-me, entretanto, a esperança de poder transformar esse material arcaico numa brochura de cem a duzentas páginas, cheia de lorotas em bom estilo."

Ao tentar efetivar essa empreitada, o autor, ao analisar os costumes da sociedade na qual está inserido, acaba encontrando semelhanças entre o povo Caeté e a sociedade de Palmeira dos Índios, mesclando-os na história:

"Escrevi dez tiras salpicadas de maracás, igaçabas, penas de arara, cestos, redes de caroá, jiraus, cabaças, arcos e tacapes. Dei pedaços de Adrião Teixeira ao ajé: o beiço caído, a perna claudicante, os olhos embaçados; para completá-lo, emprestei-lhe as orelhas de padre Anastácio. Fiz do morubixaba um bicho feroz, pintei-lhe o corpo e enfeitei-o."

Quatrocentos anos de civilização separam o povo caeté dos atuais (1933) habitantes de Palmeira dos Índios. Para o protagonista, inicialmente, aqueles selvagens em nada se assemelhavam à atual sociedade de Palmeira dos Índios. Contudo, após diversas tentativas de contar a história daquele povo, finalmente percebeu que, na verdade, estava tentando contar a história de seu próprio povo:

"Que sou eu senão um selvagem, ligeiramente polido, com uma tênue camada de verniz por fora? Quatrocentos anos de civilização, outras raças, outros costumes. E eu disse que não sabia o que passava na mente de um caeté! Provavelmente o que se passa na minha, com algumas diferenças. Um caeté de olhos azuis, que fala português ruim, sabe escrituração mercantil, lê jornais, ouve missas. É isto, um caeté."

O protagonista, ao analisar os caminhos que tomou em sua vida, chega à conclusão de que, apesar de estarmos inseridos em uma sociedade que se considera superior às sociedades primitivas, estando em um estágio supremo da civilização, continuamos tendo os mesmos desejos e agindo, muitas vezes, como selvagens.


"Tenho passado a vida a criar deuses que morrem logo, ídolos que depois derrubo — uma estrela no céu, algumas mulheres na terra..."

Gosta de Graciliano Ramos ? Leia a resenha de um dos seus livros mais famosos: São Bernardo.